Por: Adílio Jorge Marques
“A mente prende-se a uma e outra coisa. Faça com que ela se prenda unicamente a Deus. Deixe-a executar todas as ações como um instrumento de Deus e entregue a Deus também o êxito ou o fracasso, a perda e ou ganho, o júbilo e mesmo o eventual desânimo. Este é o segredo.”
Sathya Sai Baba
Aprendemos, com o tempo, a respeitar o direito das pessoas que já atingiram certa sintonia em relação às suas posições e visões da vida. São aqueles que se tornaram conscientes das obrigações nos projetos ecológicos e naturalistas, assim como dos processos espirituais da humanidade como um todo.
Tais pessoas, aquelas que vemos ou tomamos como exemplos de vida, mostram-nos também a arte de aprender a observar. Desenvolvemos, desta forma, uma consciência sobre a nossa responsabilidade neste mundo, sem impor nossos dilemas aos que nos cercam. Tais dilemas e dúvidas surgem constantemente nos dias atuais como consequência do impacto que sentimos quanto à rapidez do mundo que nos cerca, um mundo pós-moderno que tornou tudo relativizado e descartável.
“Tudo acontece na hora certa”, como nos legaram alguns filósofos e metafísicos. Continuamos, contudo, refletindo sobre aquilo que impede a realização dos nossos planos e projetos, refletindo sobre aquilo que chamamos de processo de troca ou transmissão de nosso saber. Só que muitas vezes, sem buscar isso conscientemente, somos tomados subitamente por um tipo de clarificação de nossas ideias ou problemas. Pode ser através de uma pessoa que conheçamos muito ou pouco, mas que nos faz entrar em sintonia com o nosso eu. Pode ser o mero contato com a exuberância da natureza, ou mesmo um local religioso, que nos religa ao Grande Ser. Quando isso acontece parece que mudanças nos fazem aprender, nos fazem atuar para chegar a novas respostas para o que buscamos. Como se aquele momento mágico, aquele local ou aquela pessoa fizesse a vida valer a pena. A existência toma sentido.
Quando entramos em um estado de aceitação “o universo trabalha a nosso favor”, dizem as grandes Tradições. Ao intensificar a nossa caminhada na vida, recebemos do exterior o convite e a resposta que procuramos para nossas dúvidas e problemas. Lembremos: o sonho de cada um de nós pode se “casar” com nosso projeto profissional, emocional ou espiritual, estando mais perto de se realizar do que imaginamos. Normalmente as realizações pessoais ajudam o indivíduo a crescer sem atrapalhar projetos em grupo. Para isso, contudo, temos que encarar a vida com coragem. Ou, como se diz popularmente, coragem para “viver e aprender”.
Antes de tudo temos que dar o passo: adquirir a coragem para as novas mudanças que queremos, ou que não queremos, mas que nos surgem inevitavelmente. Às vezes ficamos perdidos no começo do processo, quase revoltados, dispostos a negar tudo e a realizar o exato oposto. Mergulhamos em um processo de transformação que com o tempo irá sedimentar-se. Tocamos o real, como em uma espécie de epifania, sentindo o enlevo que a arte e a filosofia costumam provocar. Damos, então, o passo sem volta , para sempre.
Teremos nós mesmos, entretanto, sempre que formular estas questões a partir de certo momento de nosso viver. Por indisciplina, ou talvez por ingenuidade, relutamos em aprender aquilo que nos causa dor ou separação. Ouvimos de pessoas “mais experientes” que nunca deveríamos fazer isto ou aquilo. Mas, que fazer então? Deixar que o mundo nos domine? Precisamos aprender por nossos próprios pés, mesmo quando encontramos aquele alguém que nos serve de exemplo. As forças se multiplicam e a ação se intensifica quando começamos a caminhar em nosso favor. Selecionamos a semente e damos o primeiro passo. Devemos fazer o hoje enquanto nos transformamos. Em geral, muitas são as ideias que temos e que nos animam de início, porém poucas são aquelas que alcançam o plano do concreto e são desenvolvidas com sucesso.
Para que isto não ocorra devemos listar as nossas alternativas cuidadosamente. Quando formos à prática teremos já previsto e avaliado aquelas primeiras dificuldades e obstáculos que costumam fazer as pessoas desistirem de seus sonhos e projetos. Onde há vontade e determinação é possível avançar. Iremos abrindo os caminhos mesmo que eles ainda não existam.
Antes da jornada, entretanto, precisamos nos certificar de que nos munimos dos instrumentos necessários, ou seja, precisamos nos certificar de que conhecemos os nossos ideais e também de que, iniciada a jornada, estaremos comprometidos com a sua realização – nada deveria nos demover de persistir no caminho. A semente que propomos necessita de solo fértil. De modo que antes de lançá-la precisamos trabalhar a terra. Decididos a assim realizar, começamos o trabalho imediatamente, sem deixar para a tarde o que podemos bem iniciar já agora. Renunciando às forças que remam contra esta determinação. Ao decidir agora, realizamos imediatamente. Assim, rompemos com o processo de sermos impedidos de levar isso ou aquilo à frente por questões estranhas à nossa vontade, por forças contrárias à Grande Força Universal.
Como podemos iniciar um processo de troca ou transmissão de nosso saber?
Temos que fazer o hoje, enquanto nos transformamos. “Tudo o que decidires fazer, realiza-o imediatamente, não deixes para a tarde o que puderes realizar pela manhã”, diz uma máxima de grandes fraternidades. O mundo atual, nossas vidas, exige uma ação contínua. Sócrates, durante o processo de construção de sua sabedoria interior, não se restringiu à sua iluminação. Continuou a ensinar até o dia em que tomou a cicuta que o imortalizou definitivamente. Entre tantos outros exemplos da história humana, Sócrates rompe com a questão de que só se pode fazer algo aquele que já tem a experiência no passado. Ou seja, deixando o fazer por último no processo de construção interior. Sócrates foi o espelho da sua própria filosofia; e a sua palavra, o reflexo da sua ação contínua em uma sociedade que já se corrompia.
Este texto simples surgiu da experiência e da observação cotidiana de um grande ser humano que conheci faz pouquíssimo tempo. Ele não vive em minha cidade, mas é um brasileiro capaz de mudar os outros à distância, desde que estejamos abertos ao observar e aprender sem disfarçar títulos fictícios. Dedico estas linhas a esta pessoa, que prefere o anonimato.
Oi Adílio. Aproveito a ocasião para parabenizá-lo por sua honestidade intelectual, vista em cada texto desse Blog e elogiada no prefácio de seu livro Breve História do pensamento Filosófico de S.Matin e J.Boehme pelo filósofo José Rubens Turci Junior.
ResponderExcluirÉ muito bom conhecer pessoas que pensam por si mesmas. Gente que sabe pensar. Infelizmente, os livros que lemos, ou a maioria deles, (com exceção dos contos, romances e poemas) estão saturados de idéias dos outros. São, na verdade, grandes citações. Carecemos desse frescor!
Nietzsche já o anunciava em 1888 em o Crepúsculo dos Ídolos: “Aprender a pensar. Não há mais noção disso em nossas escolas. Mesmo nas universidades, mesmo entre os autênticos doutores da filosofia começa a desaparecer a lógica como teoria, como prática, como ofício...” (Cap. VIII / 7.)
Nós, seus seguidores, agradecemos a sinceridade de sua escritura e esse Blog como um convite para pensar juntos e livres.
Abraços,
Flávia