Cavaleiro

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Os créditos da ilustração são de André Marques - www.andre.art.br

Diferenças fenomenológicas entre as filosofias de Husserl e de Kant


André Vinícius Dias Senra*, Adilio Jorge Marques**


Introdução

O conceito de Fenomenologia é uma indicação para constituir uma ciência filosófica. Etimologicamente, phainomenon (objeto fenomênico) deve ser assunto de um saber do conhecimento em geral (wissenschaft). O termo wissenschaft tem o sentido de uma ciência da razão e não se restringe à pesquisa científico-natural meramente objetivista. Assim sendo, o conceito de Fenomenologia implica em um estudo que não leva em conta apenas o mundo objetivo, mas também como o sujeito representa o objeto de tal modo que este não seja reduzido ao solipsismo subjetivista.


Discussão

Kant pode ser considerado como o pensador que fundou as bases para o estudo de uma fenomenologia enquanto disciplina acadêmica, na medida em que cunhou a expressão ‘fenômeno’ para designar os objetos que podem ser conhecidos pela razão humana. O kantismo tornou-se referência para análise dos aspectos relacionados à teoria do conhecimento. E a característica específica da filosofia kantiana é ser uma filosofia transcendental, ou seja, buscar a fundação do conhecimento a partir do que pode ser representado fenomenicamente.

De acordo com Husserl, o método fenomenológico é o método filosófico por excelência, contudo, ele considera que o projeto filosófico de Kant encontra-se incapaz de cumprir o que promete em teoria. Husserl entende que o conceito kantiano de fenômeno sustenta-se na ideia da condição de possibilidade para uma experiência cognoscitiva. Isto significa que tal conceito fundamenta-se em uma restrição de caráter empírico, não lógico. Segundo Husserl, este é o problema kantiano na tarefa para constituir uma fundação do conhecimento a partir do que deveria ser um projeto fenomenológico. Husserl acusa Kant de ter fracassado no projeto de uma Fenomenologia porque sua filosofia seria muito fisicalista, o que tornou impossível abordar a ideia do fenômeno sem que esta não estivesse reduzida aos aspectos sensíveis.

Vendo pelo pensamento de Husserl, a superação do psicologismo torna-se necessária não somente em função do reconhecimento da esfera ideal da objetividade na condição de independente da sensibilidade, mas principalmente porque a fenomenologia pretende ser o método filosófico que estabelece a fundação objetiva para o conhecimento em geral. O psicologismo enquanto doutrina torna possível a redução da objetividade, da relação de conhecimento, aos aspectos subjetivos, tanto no sentido idealista quanto no empirista. 

Husserl considerava que a tese psicologista tem como pressuposto a tradição metafísica, que ao apoiar-se na ideia da representação subjetiva do objeto, permitiu a existência de disputas envolvendo o dualismo entre sujeito e objeto, que teve como conseqüência, o aparecimento do ceticismo, precisamente por conta da ausência de um rigoroso fundamento filosófico para a questão. É a herança do kantismo, segundo Husserl.

Deste modo, Husserl entendeu que o problema era que a base de argumentação cognitiva mantinha seu foco, até então, no objeto transcendente, do mesmo modo, e analogamente, que a apreensão intuitiva deste objeto só poderia ser efetuada pelo sujeito empírico.


Conclusões

Husserl não considera a filosofia kantiana como falsa, mas certamente insuficiente para estabelecer os parâmetros do autêntico método filosófico. Ao propor uma crítica da razão pura, Kant acertou ao perceber que o embate entre idealistas e empiristas era infrutífero e estéril para a Filosofia. Contudo, o fato é que este dualismo ainda se mantém no criticismo kantiano, de tal modo que Kant não garantiu as bases para que a Filosofia não pudesse ser superada pela Ciência. Muito pelo contrário, em sua resposta Kant nega a possibilidade da Filosofia como ciência. Para Husserl, a resposta de Kant e dos kantianos mostra falta de compreensão sobre o que deve ser uma ciência filosófica.


Referências

1 Husserl, E.  A Ideia da Fenomenologia. Lisboa: Ed.70, 1986.
2 Kant, I.  Crítica da Razão Pura. Lisboa: Calouste Gulbenkian, 1989.

*Doutorando do Programa de História das Ciências, das Técnicas e Epistemologia (HCTE) da UFRJ.
** Doutor em História das Ciências, das Técnicas e Epistemologia pelo programa HCTE da UFRJ.



2 comentários:

  1. Fala Adílio!

    Muito bom o texto, abarca dois de meus filósofos prediletos.

    Deixo um braço!

    Daniel

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